SUCESSÃO FAMILIAR PLANEJADA: DOAÇÃO OU TESTAMENTO? QUANDO E COMO FAZER?

A sucessão familiar pode ser planejada através de doação ou testamento, como forma de resolver (e participar) da partilha de bens destinada a beneficiar os herdeiros ou terceiros de acordo com a vontade do doador/testador. Evita-se, assim, a discussão e desavença tão comuns no processo de inventário.

Havendo herdeiros necessários, isto é, os descendentes, ascendentes e o cônjuge (CCivil, art. 1845), a eles pertencem a metade dos bens da herança (CCivil, art. 1846), denominada “legítima”, só podendo ser doada ou testada a outra metade do patrimônio.

A doação de ascendente a descendente ou de cônjuge a outro, importará em adiantamento do que lhe cabe em herança (CCivil, art. 544).

Nenhum cônjuge pode, sem autorização do outro, salvo no regime da separação absoluta de bens, fazer a doação de bens comuns ou que possam integrar a futura meação (parte que cabe ao cônjuge sobrevivente), exceto quando se tratar de doação por remuneração (decorrente de remuneração por serviços gratuitos recebidos) oufeita por contemplação de casamento (CCivil, art. 1647).

O testamento é o ato de declaração de vontade de determinada pessoa em relação a disposição de seu patrimônio para depois de sua morte, podendo ser feito por escritura pública, sigiloso (dito “cerrado”) ou escrito particular guardadas as devidas exigências legais para cada caso específico (CCivil,art. 1862).

No testamento podem ser instituídos herdeiros (ditos testamentários) e legatários. O herdeiro testamentário é beneficiado com uma parcela da herança estipulando-se, pelo testamento, uma proporcionalidade com o universo da herança. O legatário, por sua vez, é beneficiado por determinado bem, móvel ou imóvel, fazendo-se essa especificação de forma mais clara e objetiva possível.

A doação, ao contrário do que alguns imaginam, é ato realizado entre pessoas vivas de transferência gratuita de um bem (imóvel ou móvel), patrimônio ou vantagens para outra pessoa, por mera liberalidade (CCivil, art. 538). Não existe, portanto, a possibilidade de doação para após a morte do doador. Entretanto, é possível estabelecer-se que falecendo o donatário antes do doador, a doação poderá ser revertida, isto é, retornando o bem doado ao patrimônio do doador.  

Tratando-se de coisa móvel a doação pode ser realizada por simples contrato ou declaração, inclusive verbal, seguida de imediato da tradição (entrega da coisa doada). No entanto, sendo a doação um imóvel, a lei exige que seja feita através de escritura pública.

Além da doação pura e simples, existem outras várias formas de doação: (i) doação universal que envolve todos os bens do doador: (ii) doação condicionalcuja eficácia fica subordinada a evento futuro e incerto, por exemplo, a aprovação no concurso vestibular; (iii) doação a termo constituída em razão de acontecimento futuro e certo, por exemplo, a doação de um determinado veículo a determinada pessoa quando completar 21 anos; (iv) doação modal ou com encargoonde o donatário se obriga a realizar determinada condição, seja em favor do doador, de terceiro ou da sociedade, como por exemplo, a doação de determinado imóvel para lá ser instalada uma creche ou escola em determinado prazo; (v) doação remuneratória que se faz em retribuição a serviços prestados pelo donatário ao doador; (vi) doação em contemplação do merecimento do donatário é a que se destina a homenagear e reconhecer as suas qualidades, demonstrando sua gratidão e respeito; (vii) doação com cláusula de reversão é aquela em que o bem retorna ao patrimônio do doador em caso de falecimento anterior do donatário; (viii) doação com cláusula de usufruto é aquela em que a transfere da propriedade é realizada mas o doador se resguarda o direito de usar e gozar do bem mediante a posse direta, obtendo dele todos os benefícios econômicos até determinado prazo ou até sua morte; (ix) doação com cláusula de fideicomissoonde fica estipulado que a propriedade do bem doado, após certo tempo ou a morte do donatário, se transferirá a uma outra pessoa desde logo indicada; (x) doação conjuntiva é feita em favor e benefício de mais de um donatário, presumindo-se ter sido em partes iguais se nada em contrário for estipulada e, em caso de ter beneficiado marido e mulher subsistirá na totalidade em favor do cônjuge sobrevivente; (xi) doação em contemplação de casamentofica subordinada a realização do casamento com determinada pessoa: (xii) doação inoficiosaé aquela que ultrapassa a parte que o doador poderia dispor no momento da doação, sendo nula apenas na parte excedida, valendo em relação a parte disponível (CCivil, art. 549); (xiii) doação de bens futuros é a doação de bens ainda inexistentes no momento da doação como a próxima safra ou futuras crias de uma vaca; (xiv) doação sob a forma de subvenção periódicaé aquela renda instituída em favor do donatário até a morte do doador, salvo se outra coisa se dispuser, ou do donatário, no máximo (CCivil, art. 545); (xv) doação mista é aquela em que a vantagem obtida com o negócio é infinitamente maior que a contraprestação justa e o preço de mercado do bem, por exemplo, a compra e venda por preço muito reduzido.

 A doação pode ser revogada por ingratidão do donatário ou inexecução do encargo atribuído (CCivil, art. 550). As causas de ingratidão estão previstas na lei, destacando-se o atentado praticado pelo donatário em relação a vida do doador, cometimento de crime de homicídio doloso ou ofensa física, injúria grave ou calúnia e recusa ao doador de alimentos que este necessitava (CCivil, art. 557). Essas ofensas autorizando a revogação da doação quando praticadas em relação ao cônjuge, ascendente, descendente, ainda que adotivo ou irmão do doador (CCivil, art. 558).

Já os testamentos podem ser modificados ou cancelados até a morte do testador (CCivil, art. 1858), independente da vontade dos beneficiários ou qualquer causa justificadora, mas sempre de acordo com a disposição de bens decorrente da existência ou não de herdeiros necessários. É uma declaração da forma com que se dará a sucessão dos bens após a sua morte.

Através do testamento é possível instituir herdeiros e definir a atribuição de bens a cada um deles, inclusive beneficiando entidades assistenciais. É legítimo estabelecer cláusulas restritivas de disponibilidade dos bens como inalienabilidade (a alienação não é permitida), impenhorabilidade (o bem não responderá pelas dívidas do beneficiário) e incomunicabilidade (não beneficiando o cônjuge) e que podem ser provisórias ou vitalícias (CCivil, art. 1911), desde que presente justa causa prevista no testamento (CCivil, art. 1848).

O imposto de transmissão decorrente da doação é de 3% sobre a avaliação. Na hipótese de transmissão do bem por testamento é de 4%, isto no Estado do Rio Grande do Sul.

A estruturação do planejamento sucessório é questão que deve ser objeto de ampla reflexão considerando as peculiaridades pessoais e patrimoniais dos indivíduos envolvidos, sendo recomendável a sua utilização para famílias que buscam debater a sucessão patrimonial, podendo o doador ou testador adotar postura ativa e evitar que eventuais desejos individuais prejudiquem os interesses e direitos dos demais envolvidos.

Autor: Sergio Eduardo Martinez (OAB/RS 32803)

sergioeduardo@martinezadvocacia.com.br

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