Biodireito: Mesmo sob risco de vida, paciente não é obrigado a passar por cirurgia

Se o paciente se recusa ao ato cirúrgico, o Estado não pode invadir essa esfera e procedê-lo contra a sua vontade, mesmo que seja com o objetivo nobre de salvar sua vida. Com esse entendimento, a 1ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS) negou recurso do Ministério Público (MP), que requeria autorização judicial para que fosse realizada a amputação do pé esquerdo necrosado de um idoso que se negou a passar pelo procedimento cirúrgico. O homem de 79 anos, ex-hanseríano, é morador do Hospital Colônia Itapuã, no município de Viamão, e alegou preferir morrer para aliviar o sofrimento.

Caso

Procurado pelo médico, o MP ingressou com pedido judicial para suprimento da vontade do idoso, que, conforme o autor da ação, está com anemia acentuada (consequência da lesão) e deve amputar o membro inferior, sob pena de morte por infecção generalizada.

O pedido foi indeferido em 1° Grau. O Juiz de Direito Giuliano Vieiro Giuliato entendeu que não se trata de doença recente e o paciente é pessoa capaz, tendo livre escolha para agir e, provavelmente, consciência das eventuais consequências, não cabendo ao Estado tal interferência.

Recurso

O MP recorreu da decisão, alegando que o homem não tem condições psíquicas de recusar o procedimento cirúrgico, porquanto apresenta um quadro depressivo, conforme os laudos médicos juntados aos autos. E justificou a urgência da amputação em reconhecimento à prevalência do direito à vida, conforme prevê a Constituição Federal.

No TJRS, o relator, Desembargador Irineu Mariani, destacou o resultado do laudo psiquiátrico do paciente, apontando que o mesmo continua lúcido, sem sinais de demência.

Na avaliação do magistrado, o caso em análise se insere no denominado Biodireito, na dimensão da ortotanásia, o que vem a ser a morte no seu devido tempo, sem prolongar a vida por meios artificiais. Resumindo, o direito à vida, garantido no art. 5º, caput, deve ser combinado com o princípio da dignidade da pessoa, previsto no art. 2º, III, ambos da CF. Isto é, vida com dignidade ou razoável qualidade. Em relação ao seu titular, o direito à vida não é absoluto. Noutras palavras, não existe a obrigação constitucional de viver.

O relator citou também a Resolução nº 1995/2012, do Conselho Federal de Medicina, na qual consta que não se justifica prolongar um sofrimento desnecessário, em detrimento à qualidade de vida do ser humano. E ainda destacou o art. 15 do Código Civil: Ninguém pode ser constrangido a submeter-se, com risco de vida, a tratamento médico ou a intervenção cirúrgica.

Por fim, se por um lado muito louvável a preocupação da ilustre Promotora de Justiça que subscreve a inicial e o recurso, bem assim do profissional da medicina que assiste o autor, por outro não se pode desconsiderar o trauma da amputação, causando-lhe sofrimento moral, de sorte que a sua opção não é desmotivada, asseverou o Desembargador Mariani.

Acompanharam o voto do relator os Desembargadores Carlos Roberto Lofego Caníbal e Luiz Felipe Silveira Difini. A decisão é do dia 20/11/13.

Apelação Cível n° 70054988266

Fonte: site TJRS

A arrematação de imóvel em leilão judicial e os débitos anteriores de condomínio e IPTU

O crescente interesse de investidores na aquisição de imóveis tem se verificado também na participação de leilões judiciais onde, em regra, é possível realizar a aquisição por valores menores que os de mercado. 

Esse tipo de aquisição é, muitas vezes, vantajosa pelo preço ofertado, porém, deve ser feita com cuidado e atenção, pois a disponibilidade do imóvel e a posse podem demandar outras providências, adiando o exercício pleno dos direitos de propriedade do adquirente pela arrematação judicial.

Contudo, havendo débitos de condomínio e impostos incidentes sobre o imóvel arrematado, é indispensável que estejam referidos no edital de venda, pois, do contrário, não poderão ser atribuídos aos respectivos adquirentes. 

Em recente decisão, o Superior Tribunal de Justiça examinou essa situação, no julgamento do Recurso Especial nº1.297.672/SP, relatora a Min. Nancy Andrighi, onde restou afirmado: “A responsabilização do arrematante por eventuais encargos omitidos no edital de praça é incompatível com os princípios da segurança jurídica e da proteção da confiança.”  

Nessa hipótese examinada, o edital de venda não havia mencionado a existência de débitos condominiais, tendo sido arrematado o imóvel e a cobrança judicial já ajuizada tinha sido direcionada, após a venda judicial, ao adquirente.  

Contudo, com absoluta justiça, se entendeu que o adquirente não pode ser surpreendido com encargos ou débitos não previstos no edital, atribuindo-lhe a responsabilidade pelo pagamento de cotas condominiais anteriores a arrematação.                                                                           

E o condomínio que tem o direito ao recebimento do crédito, poderá recebe-lo do valor da venda do imóvel, já que pagos eventuais credores o saldo da venda judicial, se existente, será entregue ao devedor e antigo proprietário do imóvel arrematado.

A mesma situação ocorre se existente débito fiscal incidente sobre o imóvel, quando o produto da venda servirá para quitar o crédito tributário, eis que tal situação está prevista em lei (artigo 130, § único, do Código Tributário Nacional).

Tal situação acarreta maior segurança e certeza na aquisição de imóveis através de venda judicial, tornando essa hipótese interessante do ponto de vista do investidor, já que eventuais dívidas do imóvel deverão estar expressamente referidas no edital de venda, sob pena de não serem atribuídas ao respectivo adquirente.

É indispensável, portanto, o exame cuidadoso da ação judicial, dos editais e da situação do imóvel para se ter certeza da conveniência e benefícios dessa forma de aquisição. Observadas essas peculiaridades, é provável que a aquisição seja muito vantajosa, sobretudo porque realizada por preço abaixo de mercado e num momento de pleno aquecimento do mercado imobiliário.

Autor: Sergio Eduardo Martinez (OAB/RS 32803)

sergioeduardo@martinezadvocacia.com.br

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Matrícula Imobiliária: Essa Desconhecida (parte 2)

Em artigo anterior, referimos a característica principal da matrícula imobiliária:  a possibilidade  da constituição de um futuro registro fundiário, mediante rigoroso controle e exatidão das indicações nela contidas.   É preciso que fique bem claro, todavia, que a matrícula apenas caracteriza e confronta o imóvel nele descrito.  Não se cria e se constitui, por óbvio, quando se matricula um imóvel no registro imobiliário, a titularidade do domínio sobre esse mesmo imóvel.

Expliquemos  melhor: anteriormente à lei 6 015/73, os assentamentos eram centralizados no indicador pessoal (aquele livro que indicava o titular do domínio do imóvel); com a criação da matrícula, o assento passou a ter por base o próprio imóvel, alheando-se ao negócio imobiliário, simples pressuposto seu.   Essa inovação, por certo, foi em boa hora introduzida pelo legislador brasileiro em nosso direito, pois a matrícula, ao tomar como ponto referencial o imóvel, independente de sua titularidade, embora esta também fique consignada, tem por finalidade individuar o bem de raiz, possibilitando o cadastramento.

Todo e qualquer imóvel objeto de título a ser registrado deverá estar matriculado no livro 2  – “Registro Geral”, obedecendo-se às normas e  requisitos dos artigos 176, parágrafo primeiro, II, 231 e 232 da Lei n. 6 015/73.   Se não houver a referida matrícula, ela será aberta, obrigatoriamente, por ocasião do primeiro registro.

Exige-se a matrícula prévia como condição necessária para o assento do imóvel.   Por exemplo, se houver a expedição de mandado judicial para registro de penhora ou sequestro de certo imóvel, que não está matriculado, impor-se-á então a prévia e necessária matrícula como condição daquele registro.  E se existir a referida matrícula, mas naquele mandado judicial não houver precisa descrição dos característicos do imóvel, de suas confrontações e localização, o registro não poderá consumar-se por falta de dados de avaliação da correspondência entre o imóvel mencionado na ordem judicial e a unidade físico-jurídica imobiliária constante da matrícula.

E, se porventura, o imóvel não estiver matriculado ou registrado em nome do outorgante, o Oficial do Cartório exigirá a prévia matrícula e o registro do título anterior, qualquer que seja a sua natureza, para tornar possível a manutenção da continuidade do registro (art. 195 da Lei n. 6015).

Logo, qualquer registro dependerá, sempre, da matrícula do imóvel.

Na terceira e última parte a ser publicada do artigo a ser publicada, vamos finalmente tratar de casos práticos julgados no STJ.

Autor: Sergio Leal Martinez – OAB RS 7513

Email: sergioleal@martinezadvocacia.com.br

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Em caso de uso fraudulento de CPF é possível a obtenção de novo registro

A 6.ª Turma do TRF/1.ª Região decidiu que cabe o cancelamento de Cadastro de Pessoas Físicas (CPF) e o fornecimento de novo número diante de fraude praticada por terceiros com o documento do titular. No caso, o CPF da autora foi usado para a abertura de uma empresa.

A requerente alegou que o número de seu CPF fora indevidamente utilizado por terceiros, motivo pelo qual solicitou a regularização de seu cadastro bem como a condenação da União Federal ao pagamento de indenização pelos danos morais supostamente sofridos. A Turma, porém, considerou a inexistência da responsabilidade do órgão público em interferir em eventos fora do alcance de sua competência.

Os autos vieram a este Tribunal para revisão da sentença.

Ao manter a sentença, o relator, desembargador federal Kassio Nunes Marques, citou jurisprudência do próprio TRF/1ª Região a respeito da matéria: “é legítimo o cancelamento do número de inscrição no CPF e a expedição de outro no caso de perda, fraude, furto ou roubo do cartão original, quando este for utilizado indevidamente por terceiros, causando prejuízos ao seu titular”. (Processo n.° 0008028-77.2009.4.01.3200, Relator: Kassio Nunes Marques, 6.ª Turma, Data de publicação: 04/10/2013).

O magistrado também compartilhou do entendimento do juiz de primeiro grau quanto à inexistência de responsabilidade da União em arcar com o pagamento de indenização por danos morais que são, segundo o desembargador, “nestas circunstâncias, alheias à sua competência”.

Por esses motivos, o relator negou provimento à remessa oficial. O voto foi seguido, por unanimidade, pelos demais magistrados da 6.ª Turma do TRF/1.ª Região.

Processo n° 0008028-77.2009.4.01.3200 Data da publicação: 04/10/2013
Data do julgamento: 14/10/2013

Fonte: Site TRF1

Processo eletrônico: estamos prestes a excluir o advogado “não conectado”?

 

Aconteceu na Suprema Corte do Estado da Carolina do Norte, US: uma advogada perdeu sua licença pois negou-se a fornecer um e-mail válido. Cynthia Collie não tem e-mail, e não pretende ter. E também está disposta a defender o direito de não ser obrigada a estar conectada à internet, de nenhuma forma. Ela sequer tem um computador. O problema é que o Judiciário da Carolina do Norte criou uma regra em 2011 para os advogados que atuam naquele Estado, uma espécie de “recadastramento”, em que todos deveria fornecer seu endereço, telefone e e-mail no prazo de um mês. Cynthia não forneceu o e-mail porque não tem. Acabou perdendo a licença.

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