A homofobia no Judiciário: como estão decidindo os Tribunais sobre o tema

 

Recentemente, em setembro do ano corrente, tornou-se pública uma decisão do Tribunal de Justiça de Santa Catarina sobre um caso de homofobia: o zelador do prédio fora demitido, e ao retornar para buscar seus pertences, eis que residia no local, duas moradoras começaram a proferir palavras de baixo calão, além de desferir-lhe “vassouradas”, tudo justificado no fato de o cidadão ser homossexual. Sim, é isto mesmo que você leu. Agora, vou te contar as consequências: o agredido entrou com uma ação e ganhou R$10.000,00 de indenização das mulheres que o agrediram. E ele não foi o único, não. Para aqueles que tem coragem de levar a discussão ao judiciário, temos boas notícias: estamos evoluindo, e bastante.

Na comarca de Igrejinha/RS, no ano de 2011, foi julgada uma ação onde o dono de uma casa de lanches teria desferido um golpe na cabeça de uma pessoa com um cassetete de madeira, isto porque esta teria dito algo que o agressor julgou ofensivo bem perto do seu ouvido. As testemunhas não confirmaram esta versão, ao contrário, ficou comprovado que o rapaz foi agredido sem motivo algum, apenas por ser homossexual. O Juiz de primeiro grau julgou procedente a ação, porém arbitrou a indenização em apenas R$1.500,00. Irresignado, o autor recorreu. A Turma Recursal majorou o valor para R$5.000,00, afirmando: Em assim sendo, considerando as peculiaridades do caso concreto, ou seja, o constrangimento sofrido pelo autor e a lesão física  perpetrada (fl. 146), assim como as condições econômicas do réu, que possui uma casa de lanches, entendo adequado e proporcional o valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais)”. Você pode achar que é pouco, mas em 2011, para uma pessoa que tem uma modesta casa de lanches na cidade de Igrejinha, deve ter doído bastante no bolso.

Em 2012, na comarca de Belo Horizonte, também encontramos um belo exemplo de indenização por danos morais por prática de homofobia. Um rapaz aguardava por seu namorado em uma cafeteria dentro de uma livraria em BH, e quando o namorado chegou, ambos se abraçaram e trocaram um gesto de carinho (não, não houve beijos nem um tipo de contato mais voluptuoso, apenas um abraço afetuoso), quando o segurança se aproximou aos gritos dizendo que eles não poderiam fazer “aquilo” dentro da loja. Se sentindo tal como bandidos, em frente aos outros clientes da cafeteria, ambos se retiraram, e foram diretamente fazer um boletim de ocorrência. Após, ingressaram com ação de indenização, ganharam R$ 4.976,00, e a alma lavada. A livraria nem sequer recorreu, e lançou nota declarando que a atitude do segurança não refletia a opinião da empresa.

No ano de 2013, o mês de abril, foi julgado Agravo de Instrumento em Recurso de Revista, no Tribunal Superior do Trabalho, o caso de um cozinheiro assumidamente homossexual que “estava submetido a reiteradas ofensas no seu ambiente de trabalho. Apurou que tais ofensas não foram contestadas nem mesmo pelo agressor e que a empresa não tomou providências no sentido de coibir tais insultos.”. O Recurso foi o último suspiro do reclamado (um comércio de alimentos congelados) na tentativa de reduzir a indenização de R$6.000 que lhe fora arbitrada no TRT. Perdeu, é claro. Foi mantido o valor da indenização.

É fato, porém, que ainda temos um caminho longo para percorrer. A revista Super Interessante publicou recentemente pesquisa realizada sobre o tema: A sociedade deve aceitar a homossexualidade? Esse questionamento não deveria nem existir. Mas se engana quem pensa que a resposta já é um consenso no mundo. Entre os meses de março e abril, o PewResearch Center apresentou a questão para mais de 30 mil pessoas, de 39 países, que deveriam responder “sim”, “não” ou optar por não se posicionar. E o resultado pode surpreender: em 21 países a balança pendeu para o “não”. Enquanto no continente americano e europeu a aceitação dos direitos homoafetivos parece ser ampla, em nações predominantemente muçulmanas, em partes da Ásia, na Rússia (em que 74% da população respondeu “não”) e no continente Africano a rejeição predomina, com a Nigéria liderando o ranking da intolerância – por lá, 98% da população se manifestou contrária a aceitação da homossexualidade pela sociedade e apenas 1% se mostrou favorável. No Brasil, longe dos dois extremos, 60% dos entrevistados apoiaram a aceitação, enquanto 36% declararam-se contrários.” (Fonte: blog Revista Super Interessante, autora: Jessica Soares)

Enfim, é verdade que a discriminação por opção sexual ainda é uma realidade e temos exemplos diários em todos os noticiários. Contudo, nem tudo está perdido. Com os agredidos munidos de coragem, e o Judiciário mais atento aos fatos e a realidade e, sobretudo, menos preconceituoso, dia após dia vamos construindo um mundo melhor, onde as pessoas são respeitadas independente da orientação sexual. O que pode ser óbvio para alguns, mas para outros nem tanto.

Autor: Luciana Martinez, OAB/RS 45.362

Email: luciana@martinezadvocacia.com.br

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