Cultura Jurídica: Recurso repetitivo: afinal, o que é isso?

Escutamos com frequência sobre o assunto e na maioria das vezes a informação vem totalmente incompleta: determinado tipo de ação será julgado pelo STJ como “Recurso Repetitivo”. Ok, e o que isso quer dizer? É bom ou ruim? Vão analisar o meu caso específico ou tudo será julgado de uma vez só sem analisar as peculiaridades caso-a-caso? Nos últimos anos, diversas questões de toda ordem foram suspensas nos Tribunais Estaduais para aguardar a decisão do STJ.  Mas como começou isso?

Em maio de 2008 foi publicada uma lei que modificou um artigo do Código de Processo Civil, que passou a ser redigido assim: Art. 543-C: “Quando houver multiplicidade de recursos com fundamento em idêntica questão de direito, o recurso especial será processado nos termos deste artigo. Caberá ao presidente do Tribunal de origem admitir um ou mais recursos “representativos” do assunto e remeter ao STJ para decisão, como “leading case”, e os demais processos deste mesmo assunto ficam suspensos até a decisão superior”.

Ok, até aí entendemos. Mas por que isso é tão importante para nossa sociedade? Vamos dar uma olhadinha nos números do STJ o ano de 2013 (dados divulgados pelo próprio Tribunal em dezembro/2013): entre 2/1 e 15/12, o STJ julgou 344.034 processos, com uma média de 9.188 processos distribuídos e registrados por ministro. O número é muito relevante, e a tendência é que seja cada vez maior, com mais cidadãos buscando seus direitos e tendo cada vez mais acesso ao Judiciário. Então, na tentativa de desafogar o Tribunal que seria a última instância de Justiça no país, foi criado este mecanismo de “aglomerar” os processos por assunto e julgá-los de forma que a mesma decisão tenha validade para todos. Além disso, com um Judiciário de primeira instância cheio de peculiaridades regionais e culturais do Oiapoque ao Chuí, esta é uma forma de homogeneizar as decisões, mantendo a segurança jurídica daquele que ingressa em busca de um Direito que está sendo conclamado por muitos.

Críticas ao sistema existem diversas, mas uma coisa é certa: não há como conter a “avalanche” de processos judiciais sobre temas similares, pois a informação hoje é vastamente disseminada por diversos meios e redes sociais, e as pessoas vão cada vez mais procurar no Judiciário resolução para obter para si o Direito obtido pelo outro. Reunindo estes casos similares, e julgando-os de forma igual para todos, está garantida a segurança para estes, e talvez possam nossos Julgadores atentar mais para os casos em que o Direito mostra situações peculiares e muito particulares. É o que precisamos.

Autor: Luciana Martinez, OAB/RS 45.362

Email: luciana@martinezadvocacia.com.br

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Atualização de artigo: O Ingresso no ensino fundamental e o requisito da idade mínima

Em 2013 publicamos um artigo sobre o requisito da idade mínima para ingresso no ensino fundamental.

Pois bem, recente decisão da Justiça Federal de Santa Rosa ratificou o entendimento exposto naquele artigo, qual seja, de que não importa a idade da criança, mas sim o seu grau de maturidade.

Nesta decisão, de fevereiro de 2014, o juiz entendeu que deve ser “garantido o acesso ao primeiro ano do ensino fundamental para crianças com seis anos incompletos, desde que comprovem capacidade intelectual por meio de avaliação psicopedagógica”.

A sentença foi proferida em uma ação civil pública intentada pelo Ministério Público Federal que defende que “o regramento restritivo não possuiria amparo legal e violaria garantias constitucionais de acesso ao ensino. (…) que a capacidade de aprendizagem das crianças deveria ser avaliada individualmente e não genericamente. (…) que o critério puramente cronológico seria insuficiente para essa análise”.

A procedência da demanda foi embasada principalmente no fato de que a data estabelecida na resolução não foi fixada a partir de critérios técnico-pedagógicos e argumentou que: “De fato, tão nefasto quanto o ingresso precoce da criança no ensino fundamental pode ser o ingresso tardio de infantes emocional e intelectualmente capacitados para tanto, os quais, em uma sociedade de informação, venham a ter negado direito de avaliação que a própria Constituição Federal lhes assegura”.

O magistrado também levou em consideração, para embasar sua decisão, o fato de que a resolução atacada restringia direitos constitucionalmente previstos e que o dever do Estado é garantir a ampliação ao acesso à educação, e não restringi-lo.

Porém, para que não se cometam equívocos que também poderiam prejudicar aquela criança que não está emocional e cognitivamente preparada para ingressar no ensino fundamental, necessário que seja aferida a sua capacidade individual. E é isso que determinou referida sentença.

Segundo a decisão a partir já do ano letivo de 2015, tanto a União quanto os três estados da região Sul, RS, SC e PR, deverão estruturar adequadamente seu sistema de ensino para que possam atender ao determinado na decisão, devendo realizar análise individual de aferimento da capacidade de cada possível estudante com seis anos incompletos, independentemente de data de corte.

Esperamos que essas análises possam ser realizadas da forma mais responsável possível e que realmente consigam aferir a capacidade individual de cada criança, para que elas não sejam prejudicadas ingressando nessa nova etapa da vida escolar sem a devida condição emocional e cognitiva.

Autora: Ceres Helena Cardozo Vieira, OAB/RS nº69.390

E-mail: ceres@martinezadvocacia.com.br

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Único imóvel alugado não pode ser penhorado

A Lei nº 8.009/90 define como bem de família o imóvel residencial próprio do casal ou da entidade familiar e estabelece que esse bem não responderá por qualquer tipo de dívida contraída pelos cônjuges, pais ou filhos, que sejam proprietários e neles residam. Há algumas exceções previstas na própria lei, como no caso de créditos de trabalhadores da própria residência.

Recentemente, a 9ª Turma do TRT-MG julgou um recurso em que entendeu, por maioria de votos, que o proprietário de um único imóvel pode alugá-lo para conseguir renda para sua sobrevivência. Divergindo do entendimento adotado pela relatora do recurso, o juiz convocado Ricardo Marcelo Silva, atuando como revisor e redator, considerou que essa situação não configura desvirtuamento dos fins da Lei nº 8.009/90.

A finalidade da Lei é a proteção da família, mediante a preservação da condição de moradia. Ainda que o beneficiário não resida especificamente no imóvel em discussão, este não pode ser penhorado, se é o único de que dispõe e dele extrai renda, mediante locação, que viabiliza a subsistência e o direito de morar, embora em outro local, explicou o magistrado, acrescentando que a tese encontra amparo na jurisprudência, principalmente do Superior Tribunal de Justiça.

Para o relator, ainda que assim não fosse, os documentos anexados aos autos revelam que o imóvel penhorado é atualmente a residência do ex-sócio da empresa executada. No recurso, ele contou que residiu com sua mãe por algum tempo, porque trabalhava no interior. Como não tinha outra renda, alugou o seu imóvel. Depois, retornou à capital e voltou a residir nele. No tempo em que ficou alugado, o bem era a sua única fonte de renda. A versão foi reconhecida como verdadeira pelo magistrado, em razão das provas documentais apresentadas.

Nesse contexto, a Turma de julgadores, por maioria de votos, decidiu julgar favoravelmente o recurso do ex-sócio da empresa para tornar inválida a penhora.

( 0125200-51.2008.5.03.0091 AP )

Fonte: Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região

Mero descumprimento de obrigações trabalhistas por parte do empregador não configura dano moral

A Justiça do Trabalho recebe, todos os dias, reclamações em que se pede o pagamento de indenização por dano moral. Mas muitas vezes os pedidos são baseados em fatos infundados ou constituem meros aborrecimentos do cotidiano. O desafio do Judiciário é reconhecer os casos em que realmente se caracteriza o dano e atribuir indenização de valor proporcional à ofensa. O enriquecimento fácil deve ser coibido, a fim de se evitar a banalização do instituto, a chamada indústria do dano moral.

No recurso submetido à apreciação da 1ª Turma do TRT de Minas, uma vendedora sustentou que sofreu dano moral simplesmente porque o patrão descumpriu obrigações trabalhistas. Conforme o relato, ele deixou de recolher os depósitos de FGTS e de fazer o recolhimento das contribuições previdenciárias. Além disso, não pagou as verbas trabalhistas corretamente e sequer formalizou a rescisão do contrato de trabalho, com a entrega das guias do seguro desemprego e para levantamento do FGTS. Na visão da trabalhadora, a conduta adotada justifica a concessão de uma indenização por dano moral.

No entanto, ao analisar o caso, o juiz convocado Mauro César Silva entendeu que não é bem assim. Para ele, o descumprimento apontado gerou apenas dano de ordem material, o qual foi posteriormente reparado por um acordo celebrado pelas partes na Justiça. O ajuste homologado judicialmente acabou por ressarcir a autora dos danos pecuniários decorrentes da inadimplência dos direitos trabalhistas, não se vislumbrando aqui, contudo, qualquer ofensa à dignidade ou honra da reclamante, destacou.

O relator esclareceu que não é qualquer tipo de tratamento ofensivo praticado contra o trabalhador que garante o direito à indenização por danos morais. A conduta antijurídica a ensejar a reparação por danos morais deve, irrefutavelmente, ser capaz de ofender a honra e a dignidade da pessoa humana, atingindo-a em sua esfera mais íntima, de modo a lhe causar transtornos de ordem psíquica ou até mesmo física, explicou, entendendo não ser este o caso da reclamante.

Na avaliação do julgador, a conduta do reclamado não expôs a empregada a situação vexatória, de modo a causar um dano moral. O que houve foi uma lesão patrimonial, reparada em momento posterior pelo acordo ajustado entre as partes e homologado judicialmente. Com o acordo, as partes envolvidas foram conduzidas ao estado em que se encontravam anteriormente, nada mais sendo devido.

Com esses fundamentos, a Turma de julgadores negou provimento ao recurso da trabalhadora no aspecto, por maioria de votos, confirmando a sentença que indeferiu a indenização pretendida. A decisão transitou em julgado.

( 0000623-61.2013.5.03.0079 RO )

Fonte: Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região

Publicação no JC – Jornal da Lei, 11 de março de 2014.

Boa tarde! Hoje foi publicado artigo do Adv. Sergio Eduardo Martinez no Jornal do Comércio, no caderno denominado “Jornal da Lei”, sobre a arrematação de imóvel em leilão judicial. Este artigo já foi publicado no nosso blog e pode ser acesso por este link: (http://www.martinezadvocacia.com.br/blog/index.php/a-arrematacao-de-imovel-em-leilao-judicial-e-os-debitos-anteriores-de-condominio-e-iptu/)

Agradecemos ao veículo pela divulgação!

JC 11-03-2014