A (in)dignidade do trabalho humano

Recentemente, uma série de casos sobre indignidade do trabalho humano foram divulgadas pelos Tribunais Regionais do Trabalho, demonstrando a relevância que o tema tem e dando conhecimento aos cidadãos sobre uma realidade que é (outrora era) pouco conhecida por algumas camadas sociais.

Essas práticas, além de repudiadas pela ordem jurídica, pela moral e bons costumes, estão elencados no Código Penal como crime (Art. 149. Reduzir alguém a condição análoga à de escravo, quer submetendo-o a trabalhos forçados ou a jornada exaustiva, quer sujeitando-o a condições degradantes de trabalho, quer restringindo, por qualquer meio, sua locomoção em razão de dívida contraída com o empregador ou preposto: Pena – reclusão, de dois a oito anos, e multa, além da pena correspondente à violência.). Além disso, no âmbito da Justiça do Trabalho poderão ensejar indenizações ao trabalhador, superadas as questões do contrato de trabalho em si.

Não raro os depoimentos dos trabalhadores narram situações absolutamente degradantes, como por exemplo no processo nº 00003261220125020372, do TRT2, onde uma testemunha declarou: “as necessidades fisiológicas eram realizadas em um buraco no chão dentro de um “fechado de madeirite”, e a comida (arroz, feijão, óleo, açúcar e carne) era fornecida pela empresa a cada quinze dias e preparada pelos próprios empregados em um fogão de duas bocas. A carne era seca ao sol e recebida em algumas ocasiões já estragada, vez que chegava à obra embrulhada em uma lona, no mesmo caminhão que transportava graxa e óleo.”. Neste caso específico, a indenização arbitrada ao trabalhador foi de R$15.000,00.

Note-se que o dano moral na seara trabalhista ainda contém muitas especificidades, mas temos inúmeros acórdãos que decidiram magistralmente sobre o tema, como este processo julgado pelo TRT1 (01036-2006-004-01-00-4), cuja ementa transcrevo parcialmente:

“INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. AMBIENTE DE TRABALHO EM PÉSSIMAS CONDIÇÕES. A origem do Direito do Trabalho tem em seu âmago a luta por melhorias no ambiente de trabalho, aliado a uma tentativa de redução da mais-valia. A Constituição da República impõe ao empregador proporcionar aos seus empregados dignas condições do ambiente de trabalho. Agride a moral do trabalhador, quando é destacado a trabalhar em ambiente sem refrigeração, banheiro próximo ou água potável, com ratos e insetos, sujeito a inundações e vazamento de esgoto em dias de chuva.” Neste caso, a indenização ao autor foi fixada em cinquenta salários básicos deste trabalhador, que à época era R$1.481,70 (um mil quatrocentos e oitenta e um reais e setenta centavos), totalizando então a indenização em R$74.085,00 (setenta e quatro mil e oitenta e cinco reais).

Entre as práticas mais repudiadas pela JT estão a falta de condições básicas de higiene, banheiros improvisados sem condições sanitárias, alimentação sem segurança, com alimentos estragados e frios, alojamentos superlotados, jornada de trabalho excessiva e contínua, sem folgas, e outras.

É verdade que o empregador brasileiro está cada vez mais atento aos direitos fundamentais de seus empregados e procura em geral dar-lhe melhores condições dia após dia, acompanhando a evolução não só do judiciário, mas também da própria espécie humana. Porém, infelizmente ainda existem aqueles que não compreenderam que a dignidade do trabalho humano é o ponto de partida para uma evolução ampla em todos os sentidos da vida em sociedade.

Felizmente, o Ministério Publico tem feito a sua parte, investigando e denunciando casos importantes de indignidade. Afinal, é no primeiro artigo da Constituição Federal Brasileira que temos os fundamentos do trabalhador reconhecidos: “III – a dignidade da pessoa humana, e IV – os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa”. E acaso não respeitados os direitos básicos o Poder Judiciário está muito propenso a indenizar os trabalhadores expostos a tal conduta.

Autor: Luciana Martinez, OAB/RS 45.362

Email: luciana@martinezadvocacia.com.br

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